De Torroselo ao “Bom Nome”
Depois de três dias na Serra da Estrela, o corpo pede repouso. Mas quem não se dá por satisfeito em ver só a parte essencial, é bom não destreinar. Por isso, logo na tarde do dia seguinte a termos regressado a Torroselo, fomos ao “Bom Nome”. Dir-se há:- Que pode importar o “Bom Nome” a quem foi às Lagoas e aos Cântaros? Ora, não é bem assim. Nem só as grandes altitudes dão os estonteantes panoramas.
E a prova disso, é que tendo nós subido ao marco geodésico, sem o que não valeria a pena ir ao “Bom Nome”, e visitado o Fragão da Moira, o Rodrigues estendido sobre a “masseira”, o “tabuleiro” e a “malga de baquear” que junto ao marco as chuvas tinham delineado sobre a mole do granito, puxou do seu inseparável livrinho de notas e escreveu: “Bom Nome: belo”.
O Alva descreve uma graciosa curva junto a Sandomil; e se não fossem por um lado os contrafortes de Loriga e por outro, os cerros da Póvoa das Quartas e da Chamusca, o sítio seria flagrantemente invulgar.
A Estrela, o Caramulo… Entre serras…
À volta fomos às uvas ao “Paúl”; começavam de aloirar as brancas e comprimiam-se já as bastardas.
Do alto da Quinta da Bela Vista olhámos o Caramulo. O disco do sol não fazia impressão à vista: era um globo do sangue palpitando entre farrapos de nuvens formando baías, serras, lagoas, navios em linhas de combate e silhuetas de monstruosos animais.
O Rodrigues fixava-se.
--Direita volver!
Um clarão, mais suave do que o que se espreguiçava por toda a “barra”, desenvolvia-se atrás da Serra.
Estava-se no plenilúnio. O Rodrigues tinha de vibrar até à medula ante os quadros da Natureza
A arquitectura e a pintura renovavam-se indefinidamente. O hóspede da Beira humedeceu olho a olho com a lua cheia assente já no extremo da Penha dos Abutres e mal articulou umas palavras:
_ “Isto” queima! – E estava mais gordo e sentia-se com mais energia, Santo Deus!
-Para casa! Para casa! Havia que fazer.
Fonte: “Entre Serras… Herminismo”, de F. Mendes Póvoas, Julho de 1926